quarta-feira, 4 de maio de 2011

Bagunte Medieval

O conhecimento de Bagunte medieval fornece um enquadramento, mesmo que tardio, para melhor conhecimento da Cividade. Na freguesia houve antas e outeiros, houve vilas rústicas, algumas certamente de origem romana, como Vila Verde; já se encontraram ruínas romanas também em Vilar. Bagunte medieval aparece como uma terra muito povoada e de grande potencial agrícola, onde têm interesses o Rei, nobres e mosteiros.
Para este efeito, a freguesia não se pode dissociar do Outeiro Maior, que fica mesmo ao fundo do monte onde se desenvolveu aquele povoado antigo; nesta freguesia se manteve ao longo dos séculos a única casa nobre de raiz medieval das redondezas.

No sopé do monte da Cividade de Bagunte

(“Subtus mons civitas Bogunti”)

Por causa do monte da Cividade, o nome de Bagunte ocorre em muitos documentos medievais como ponto de referenciador, mesmo que esses documentos digam não raro respeito a freguesias vizinhas. Escrevia-se que tal propriedade ficava no sopé da Cividade de Bagunte: “subtus mons civitas Bogonti” (1038), “ad radeice civitas Bogonti” (1028)[1].
Mas houve uma segunda razão que valorizou a freguesia nesses tempos recuados, a estrada (que era caminho de Santiago) que vinha do Porto, por Moreira da Maia, Vairão, Ponte d’Ave e seguia depois para Rates.
Parece contudo que não foi a Cividade que deu o nome à freguesia: foi a vila de Bagunte que lho deu.
Qualquer que tenha sido o étimo desta palavra, ela terá vindo para nome da vila como antropónimo, só depois passando a nome da freguesia.
A paróquia de Bagunte já vem assinalada no Censual do Bispo D. Pedro, de cerca de 1080.

Qual a origem do nome da freguesia?

Em Lugo, na Galiza, há um concelho chamado Begonte. O Begonte de lá e o Bogonte de cá originam-se na mesma palavra. Veja-se o que diz a Wikipédia a propósito.
Abogunte, aliás, Abogunto, homem de luta. É sem dúvida esse o étimo de Bagunte. As outras possibilidades não me parecem de aceitar.

Como se chamava a Cividade?


Cunha e Freitas, num artigo intitulado “Memórias para a história das freguesias de S. Simão da Junqueira e de Santo André de Parada”[2], transcreve um trecho das memórias paroquiais de 1758 que nos fala da Cividade em termos com certeza muito próximos dos que poderiam ter sido utilizados na Idade Média por qualquer pároco a quem pedissem a descrição das ruínas:
“No monte da Cividade (…) houve antigamente uma cidade chamada Brachal ou Brachelense ou, por outro nome, Azeveoso[3] e, pela parte do norte que lhe ficava para a sua defesa um castelo, que se chamava Argifonso, e hoje, com pouca corrupção, se chama Castelo de Gifonso, e desta cidade e castelo só aparecem hoje alguns vestígios”.
Neste contexto, castelo não tem necessariamente o sentido que lhe damos hoje, mas a verdade é que havia ali algo como muralhas que impressionaram em tempos bem recuados[4]. Então os vestígios quer da Cividade quer do “castelo” de Argifonso seriam bem mais nítidos, já que, no correr dos tempos, a sua pedra foi sendo utilizada para novas construções.
Vejam-se alguns documentos medievais que mencionam Argifonso e Azevoso:
Em 1172, Bermudo Peres e sua esposa, Maria Oariz, venderam a Paio Pais, prior do mosteiro de S. Simão, uma herdade na vila rústica de Argifonso, que ficava no sopé de Alzevoso (há no geral formas um pouco diversas para estes nomes), próximo ao rio Este (“in villa que vocitant Argifonsi subtus mons Alzevoso discurrente rivulo Aliste”).
Em 1185, Paio Fafes vendeu a Soeiro Fafes uma herdade na vila de Corvos, no sopé do monte da Cividade de Azevoso, território bracarense, entre o Ave e o Este (“villa que vocitant Corvus subtus mons civitas Azevoso teritorio bracarense discurrente ribulo inter Ave et Aliste”).
Se o documento anterior mencionava uma vila a norte do monte da Cividade, agora menciona-se Corvos, a sul, mas também bem próximo dela, e a Cividade é simplesmente Azevoso.
Num documento do ano 985, relativo à “vila” de Figueiró, lê-se que ela ficava “suptus castro argefonsi discurrentis ribulo aue” (no sopé do castro de Argifonso, próximo do rio Ave).
Não encontrámos nenhum documento destes tempos antigos que mencionasse Brachal ou Brachelense.
Há um documento de Afonso Henriques, ainda príncipe, que citamos à frente, datado de 1136, que também refere a Cividade de Azevoso.

Porque se associaria a cividade ao nome da vila de Bagunte, bastante distante, se havia outras, como Corvos e Gacim ali muito mais perto?[5]
Tal teve a ver sem dúvida com direitos de propriedade; os mesmos direitos que levaram a prolongar Bagunte até à Senhora das Neves, passando por Corvos.
Deve-se ter em conta que da vila de Gacim, nos limites do Outeiro Maior com Bagunte, se conservam talvez tantos documentos como das outras vilas da vizinhança todas juntas; e também há número significativo de documentos sobre a vila de Corvos.
O que parece claro é que Bagunte não é o nome que o povoado teve quando era habitado.

À Ermida da Senhora das Neves, segundo o Tombo da Comenda de Balasar, chamou-se noutros tempos Ermida do Vale de Flores, porque ficava ali no Vale de Fores. Alguma coisa este tão poético nome teria a ver com a Cividade.
Também a Casa de Cavaleiros teve, sem dúvida, na sua origem a ver com a mesma Cividade. Aliás, nela terão ocorrido achados romanos.
A Cividade não testemunha a memória mais antiga de actividade humana em Bagunte; essa cabe ao Outeiro de Anta e a Vilar de Anta. Anta, por enviar para uns dois milénio antes de Cristo, e outeiro por ser ele com certeza também anterior à Cividade. E está ali ao lado o Outeiro Maior[6].

A Cividade de Bagunte na literatura


Agustina Bessa-Luís escreveu o seu O Soldado Romano por inspiração da Cividade e porque na adolescência viveu algum tempo em Cavaleiros. A acção decorre na actualidade, mas há uma personagem antiga evocada, o soldado romano. Veja-se esta breve passagem do conto:
 “Ao pé da aldeia de Corvos erguia-se o monte da Cividade. Tinha sido um quartel dos romanos e havia lá ruínas que eram a prova disso. Via-se o mar desde ali e o silêncio, mesmo com dia claro, causava impressão. Nós levávamos batatas para assar e não ficavam bem assadas, mas sabiam-nos bem assim. Com muito sal e meias cruas.”
Também é mencionada a Senhora das Neves.
Acrescente-se que este conto é ilustrado (por um vila-condense) e que as ilustrações relativas à Cividade correspondem bastante de perto à realidade do lugar.
Onde nada disto aparece é no romance da mesma autora Antes do Degelo, apesar de nele se referir Cavaleiros.
Uma Deusa na Bruma


[1] Há modos mais curiosos de escrever isto; por exemplo: “subtus Zividad Bogonti” (1036), “subtus cividá bogonti” (1050), “subtus Castro Aregefonsi et civitas Bocunti” (1102).
Os documentos medievais que vão ser citados ora vem no livro de Sérgio Lira (ver bibliografia), nos Portugaliae Monumenta Historica ora ainda noutras fontes.
[2] Boletim Cultural de Vila do Conde, Nova Série, nº 13, pág. 30. Esta citação encontra-se também, naturalmente, no livro de Bernardino Areal da Silva (Ver bibliografia).
[3] Um documento do início do século XVI fala duma fonte de Zeboso (Eugénio Andrea da Cunha e Freitas, “Memórias para a História das Freguesias de S. Simão da Junqueira e de Santo André de Parada”, in Boletim Cultural de Vila do Conde, nova série, nº 13, pág. 26), nome que sem dúvida corresponde a Azevoso.
[4] O Castro de Argifonso também já foi estudado, como consta dum trabalho publicado sobre ele por F. Russel Cortez.
[5] Com certeza no contexto da nova divisão administrativa que os governos liberais impuseram ao país, o arcipreste vila-condense Domingos da Soledade Silos, em 1845, propôs que Corvos fosse integrado no Outeiro Maior. Tal nunca aconteceu nem virá a acontecer, mas dá razão à questão estamos a abordar.
[6] Ainda nos não foi possível descortinar um sentido para o comparativo maior, que ocorre no nome desta freguesia, mas ele ocorre em nomes como Montemor, Rio Maior, Campo Maior, etc. É uma palavra com um longo rasto na história da cultura.

Imagens, de cima para baixo:

Croquis-mapa da freguesia de Bagunte.
Pormenor da Cividade.
Capa d'O Soldado Romano, de Agustina Bessa-Luís.

Paio Guterres

Paio Guterres não nasceu em Bagunte nem aí viveu, mas mesmo assim merece figurar neste trabalho. Ele foi um nobre importante no seu tempo, muito abastado, amigo do Conde D. Henrique e do seu filho, D. Afonso Henriques. Terá sido irmão do possível fundador da Casa de Cavaleiros, D. Fáfia Guterres. Foi grande benfeitor do Mosteiro de S. Simão.
Em 1136, D. Afonso Henriques, ainda infante, outorgou-lhe carta de couto, “abrangendo nela as propriedades que o rei e o mosteiro de S. Simão da Junqueira tinham entre os rios Este e Ave”[1]. Veja-se como limitava com esta freguesia: vai “pelo ribeiro de Frionas e vai ao monte de Ladainhas e daí a Pedras Chãs, por cima de Gacim, e daí pela raiz do monte da Cividade e daí corre por aquele Fontanelo que vem do monte da Cividade de Azevoso…”[2].
Sendo assim, já se vê que ele tem um lugar na história da freguesia. Depois, Paio Guterres é um antepassado próximo dos Lourenços da Cunha de se falará abaixo.

No volume I do seu trabalho sobre o Mosteiro de S. Simão da Junqueira, pág. 77, Sérgio Lira atribui a Paio Guterres os seguintes filhos: Justa Pais, Pedro Pais, Fernão Pais. Fernão Pais teve Lourenço Fernandes. Lourenço Fernandes foi pai de Martinho Lourenço e Gomes Lourenço; e Martinho Lourenço pai de Lourenço Martins.

Verificar pelo Diplomática
Os Cunhas eram da mais alta nobreza do país


A Karraria antiqua, pousada real e mordomos da terra de Vilar


Segundo as Inquirições de 1220, o Rei, quando viesse a Bagunte (talvez melhor, quando passasse por Bagunte), tinha lá direito a uma mesa recheada, com fogaças, muitas galinhas, um capão e ovos. Mas não é tudo: tinha ainda direito a casa onde descansar, a doze dinheiros: “E quando El-Rei vier à mesma terra dão-lhe desta igreja uma fogaça de trigo, de Vilar duas fogaças de trigo, e de Carcavelos e de Bagunte doze dinheiros de pão. E todos desta colação dão cada um a sua galinha. E do Souto de Carcavelos, um capão, dez ovos”.
“Na Quinta de Vilar deve haver serviceira e é pousada do Rei”.
Em 1258, confirma-se que o Rei tinha aí a sua pousada: “E há aí a pousada de El-Rei e são presseiros e pregoeiros”.
Com a deslocação da corte para sul, estas pousadas reais entretanto perderam qualquer interesse; mas sabe-se que noutros tempos eram usadas, como foi o caso da de Santa Cristina, em Touguinha, onde um rei de Leão deu despacho.
Um documento de 1199 referia-se a Vilar como “Vila Vilar”.
Pelos estudos do Dr. Cunha e Freitas[3], sabe-se que por Vilar passava a Karraria antiqua e a via vetera, antiquíssimas estradas que, remontando aos Romanos, vinham do sul, atravessavam o Ave em Bagunte e seguiam depois pela Junqueira, Arcos e Rates para a Galiza ou, em bifurcação, para Barcelos.
Era sem dúvida estrada de funcionários régios e dignitários religiosos, de almocreves e outros populares, mas também de peregrinos de todas as classes a caminho de Santiago, de jograis e porventura trovadores, mas certamente também guerreiros.
O Censual do Bispo D. Pedro estipula que a igreja de Bagunte pague um “jantar”. Este jantar, “também chamado parada ou procuração” e que consistia em aposentar o prelado ou o seu representante e respectiva comitiva na visita anual às paróquias”, terá também algo a ver com a travessia da freguesia pela karraria ou estrada.
Bagunte, e Vilar em particular, beneficiaram da movimentação que esta via proporcionava.
Vilar fornecia também o mordomo do Rei – o mordomo da terra – que lhe recorria as rendas “entre Ave e este”. Em 1258, regista-se: “Item, estes homens de Vilar devem ser serviçais do foro de todo o pão que El-rei possui entre Ave e este e devem ser mordomos de foro de rico-homem, não de prestameiro”.
Estes mordomos tinham ainda de pagar “dois morabitinos, isto é, um de entrada e outro de saída, se durarem até ao fim das colheitas”. Claro que iam buscar tal dinheiro ao bolso dos foreiros de Rei.

As vilas


Na área de Bagunte - não conside­ramos agora Santagões - houve na Idade Média várias vilas, o que não era nada de extraordinário. Havia, como hoje há ainda na toponímia, Vila Verde; mas havia ainda a vila de Figueiró, a de Carcavelos, a de Corvos, a de Vilar, a de Segemonde, a de Ceisão[4]. Sobretudo havia a vila de Bagunte, que deu nome à freguesia.

Bagunte
Foi certamente um possuidor desta vila que, talvez já nos séculos IX ou X, ergueu a primitiva matriz da terra. E como ela ficava na vila de Bagunte, toda a área em redor ficou a ser de Bagunte.
Por isso, procurar a origem do nome da freguesia não é logo uma questão etimológica, mas histórica. A etimológica, essa põe-se a respeito do fundador da tal vila.
A palavra apresenta nos documentos diversas variantes, mas nunca muito distantes da forma actual: Bocunti ao lado de Bacunti... as diversas formas.
Um documento de 1189 fala do lugar chamado Bagunte (“qui dicitur Bogonti”), que fica sob o monte de Bagunte (“sutus mons Bogonti).

Vilar
Há vários documentops que referem Vilar, como este de 1170, que diz que Martinho Garcie fez “carta” duma herdade que tinha em Vilar, entre a Plantada e o Censo (“Villare inter Plantata et Censum”).
Em 1199, João Mendes e sua esposa Maria Anes doaram ao Mosteiro de S. Simão a herdade que tinham na Vila de Vilar, território bracarense, no sopé do monte Bagunte, próxima dos rios Ave e Este (“in villa que vocitant Vilar territorio bracharense subtus mons  Bogonti discurrente rivulo inter Ave et Aliste”).
Há um documento de 1189 que fala das “casas de sobre a fonte de Vilar, com os seus lugares, com a leira da Silva e com meia leira de Novais”.
No século XVI, segundo o tombo da freguesia, ainda havia em Bagunte, um leira com o nome de Pousada.

Corvos
Corvos ocorre em vários documentos medievais. Em 1143, Mendo Peres e seus irmãos Pedro e Aires Peres vendem a Paio Guterres um herdade na Vila de Corvos (“villa quos vocitant Corvos”).
Em 1193, Fernando Peres vendeu a Soeiro Fafes[5] um herdade na vila de Corvos, no sopé do monte Azevoso, próxima dos rios Ave e Este (“villa que vocitant Corvus subtus mons Azevosu territorio bracharensis discurrente rivulo inter Ave et Aliste”).
Doc 141

Vila Verde
As menções mais antigas de Vila Verde só as encontrámos nas Inquirições; que sejja do nosso conhecimento, não ocorre nos documentos do Mosteiro de S. Simão da Junqueira.
No Nobiliário das Famílias de Portugal, de Felgueiras Gaio, a propósito dos Ferreiras medievais (futuros Ferreiras d’Eça, de Cavaleiros), fala-se repetidamente de Vila Verde; embora o autor não entende por este nome a Vila Verde de Bagunte, é provável que de facto se trate dela.
No número dois da Portugália, 1905-1908, vem um artigo sobre o “Cemitério de Vila Verde”. De facto, alude-se aí a um achado arqueológico ocorrido ocasionalmente em 10 de Agosto de 1905. O autor foi José Peniche. Ricardo Severo, autor do artigo, cataloga o espólio em objectos de barro comum e objectos de metal. A seguir, divide os objectos de barro comum em: 1) vasos abertos, pretos e tigelas; 2) vasos campanulares sem asas; 2) vasos com uma asa; 4 - vasos com duas asas; e 5) louça pintada. Nos objectos de metal, distingue sobretudo 16 moedas romanas dos séculos III e IV. Pelas imagens que ilustram o artigo, muitos dos artefactos de barro encontram-se em óptimo estado de conservação.

Fotografia

Figueiró
Figueiró aparece, por exemplo, num documento de 1080, quando um tal Gonçalvo Roubares (Gunzalvo Rauparici, conhecido na história do Outeiro Maior) vende a sua vila de Figueiró (villa quos vocitant fikeirola), que ficava no sopé do Castro de Argifonso e que confinava com a Vila de Bagunte (uilla bocunti), com a Vila de Santagões (villa celteganus) e com a Vila de Lamesinhos (villa lamesinus), futura Quinta de Cunha. Na venda incluem-se também “as suas pescarias e os seus moinhos no rio Ave”. Esta grande vila não se dividira então ainda em Figueiró de Cima e Figueiró de Baixo. Reparar com não é indicada a limitação com Vila Verde.

Sogemonde
São vários os documentos que mencionam Sogemonde; um, de 1056, fala das vilas chamadas Figueiró e Sogemonde, no território portucalense, sob o castro de Argifonso, entre o Ave e o este (“villas quos vocitant fiqueirola et segemondi teritori portugalesis subtus kastro argefonsi inter abe et aliste”). Ficaria ela junto a Figueiró?
O tombo de Bagunte fala dum “marco que está acima da fonte de Vila Pouca que parte por Bagunte e Para­da e São Martinho”. Seria esta Vila Pouca a antiga Sogemonde?

Ceisão
Não é certo sequer que a vila de Ceisão ficasse em Bagunte; o que ficava era entre o monte da Cividade e o rio Ave. Em 973, fala-se da Vila Ceisão, sob o monte Bagunte (“in villa zelsoni subtus monte bogonti”), e alude-se ao “termino de peraria”, que poderia ser o limite com Pereira.
É por um documento de 1101 que ficamos a saber que Ceisão ficava no sopé da Cividade de Bagunte, próxima do rio Ave (“in villa quos vocitant ceison subtus mons civitas Boconti discurrente ribulo Have”).


[1] COSTA, Avelino de Jesus da – Estudos de Cronologia, Diplomática, paleografia e histórico-linguísticos, Porto, 1992, pág.
[2] “… de illa foze de Fontano, et vadit sursum et fer in illum cazalem de Gontino e inde per arogium de Frionas et vadit ad monte de Litanias et inde ad Petras planas desuper Gazim, et inde per radicem montis de civitate  et inde discurrit per illum Fantanelum qui guadit de monte Civitatis de Azevoso et discurrit ipso Fontano, ut exterminat per illum Conarum, qui est in Cabo de Lagona de Arcos …”
[3]Estradas velhas entre Leça e Ave” in separata do Boletim do Douro Litoral, e ainda “Pontes” in Boletim Cultural de Vila do Conde, Nova Série, nº 1º, págs. 40 e 50.
[4] Não é possível provar que a vila de Ceisão pertencesse a Bagunte, mas estamos em crer que pertencia. De qualquer modo ficava entre o monte da Cividade e o Ave.
[5] Soeiro Fafes será sobrinho de Paio Guterres.

Imagens:
Vista do rio Ave em Bagunte.
Igreja Paroquial.

Cunhas em Bagunte

No século XIII, os Cunhas estavam ligados à corte e possuíam uma posição social relevante a nível do país. O que nem sempre lhes trouxe proveito. Esta família, nos seus elementos mais recuados (isto é, mais antigos e conhecidos) tem raízes que a prendem às vizinhanças de Bagunte. Segundo Sérgio Lira, o seu mais antigo antepassado conhecido seria irmão do antepassado mais conhecido dos Cavaleiros do Outeiro Maior, D. Fáfia Guterres[1].
Um célebre elemento desta família dos Cunhas foi Lourenço da Cunha. Entre os feitos dignos de menção que dele se relatam, conta-se a sua participação no saque a Triana (a parte de Sevilha que fica na margem direita do Guadalquivir), em 1176, ao lado de D. Sancho I, donde terá trazido significativo pecúlio. Seria então muito jovem[2].
As Inquirições de 1258 mencionam em Bagunte dois filhos seus (talvez então já falecidos), que haviam sido activos no latrocínio da propriedade real: João Lourenço da Cunha e Martim Lourenço da Cunha. Em Parada, Martim Lourenço da Cunha chegou a fazer “em Lamisinhos uma honra nova e pôs-lhe o nome de Cunha Nova”. Desta Cunha Nova, sem dúvida a Quinta de Cunha, chegou até nós um documento de 1241. Era Cunha Nova por oposição à velha, sua homónima, numa freguesia do actual concelho de Braga.

As violências de João Lourenço da Cunha


Vejamos agora a relação das violências que as Inquirições de 1258 assacam a João Lourenço da Cunha.
Era solteiro este Cunha e acabará por deixar a fortuna própria a um irmão, de nome Vasco. João Lourenço da Cunha surge associado à depredação da propriedade régia em Figueiró de Cima, na devesa de Onega, em Pereira, na Corneliana (Correlhã?) e ainda no narseiro de Penela. Qualquer destes actos deveria trazer dores de cabeça aos homens de Vilar, até porque as coisas às vezes iam bastante longe.
Em Figueiró de Cima, “João Lourenço da Cunha fez uma honra nova e uma vinha e apropriou-se de campos e herdades não suas e deitou fora deles os homens de El-Rei e alguns há que não ousam entrar aí por medo dele e pela pousada que fez João Lourenço, pela qual se destrói este lugar e o reguengo circunjacente”.
A devesa de Onega, que era do Rei, “pela qual e da qual o reguengo de El-Rei se povoava, o mesmo João Lourenço da Cunha destruiu-a e apoderou-se dela”.
Na Vila de Figueiró, havia «uma grande peça de reguengo de El-Rei (…) e Lourenço da Cunha tem-na pela força. Embora o mordomo da terra e o alcaide atestem o pão, nada dá pela defesa deles, mas penhora por si no reguengo de El-Rei e por toda a terra».
Na Corneliana, a violência deste rico-homem assume aspectos mais cruéis, mais convincentes:
“No lugar de Cirquido[3], há uma leira reguenga de El-Rei; já passaram bem catorze anos que não é trabalhada por proibição e medo do mesmo João Lourenço; e os homens do Rei que quiseram trabalhar, prendeu-os pelas suas gargantas”.
Insaciável, este Cunha não respeita ninguém:
“Em tempo deste Rei, espoliou um homem de El-Rei, de nome Paio Pais, da sua herdade que havia comprado a um irmão da sua mulher que mora em Sintra. E além disto, fez muitas outras maldades em seu proveito”.
Um ou outro dos lugares aqui mencionados será já desconhecido em Bagunte na actualidade; a maior parte porém é bem identificável. A palavra narseiro, ou nasseiro, vem de nassa, e remete para uma forma de apanhar peixe no rio.


Martim Lourenço da Cunha actuou entre Carcavelos e Figueiró, em Sob-o-Monte Ceano, do outro lado do rio, e no narseiro da Pedra Alva.
As suas prepotências têm menor alcance que as do irmão e são também em menor quantidade. Aliás, faz sentido, se soubermos que ele apoiara o Conde de Bolonha na luta contra Sancho II. Assim, “na saída de Carcavelos e Figueiró”, fez um casal de novo, “onde não devia fazer, pois são homens de El-Rei, e por isso estão as duas vilas cegadas, que não têm saída nem pastagens”.

D. Sameiro e a Ponte d’Ave


 Se a história de Bagunte e suas redondezas se não pode fazer sem referência ao Mosteiro da Junqueira, também se não pode fazer sem referência a uma casa tão nobre e antiga como foi a de Cavaleiros, no Outeiro Maior, e mesmo à Quinta de Cunha.
É em documentos dos mais antigos senhores conhecidos de Cavaleiros que surgem as primeiras referências à ponte de D. Sameiro[4].

Num documento de 1167, os filhos de Fafia Guterres dividem entre si a herança paterna. Esses filhos são Soeiro Fafes, Mor Fafes, Martinho Fafes, Pedro Fafes e Nuno Fafes. Quase um século mais tarde, nas Inquirições de 1258, diz-se de “S. Martinho do Outeiro” que “esta paróquia é Honra dos Cavaleiros desde antigamente, da família de D. Fafia Guterres”. Isto é, tratava-se dos mais remotos senhores de Cavaleiros de que há memória.
Em 1210, Pedro Fafes faz testamento e para a ponte de D. Sameiro e de D. Goncinha deixa um maravedi[5]. Mas já antes, talvez em 1205 (não é possível precisar mais a data), o seu irmão mais velho, Soeiro Fafes, também em testamento, dissera de certa propriedade que as suas rendas deviam ir para a ponte, até à conclusão dos arcos: tratar-se-á com certeza da mesma ponte de D. Sameiro.
Nas Inquirições de 1220 escreveu-se sobre esta ponte:
"Havia aí outros campos reguengos de que fizeram dois casais, e dizem que El-Rei Afonso os deu à ponte de D. Sameiro e depois o Rei D. Sancho concedeu-lhos. E o abade sobredito disse que este Rei D. Afonso concedeu os ditos casais à mesma ponte e disso fez carta”.
A ponte também é mencionada em 1258: "Acrescentaram também que aquela ermida que se chama da Santa Cruz, que está na ponte de Sameiro, é da Igreja de Santa Maria de Bagunte, de que tem grande força, e El-Rei tem aí dois casais que foram dados para fazer a ponte e, feita esta, não os possui El-Rei, do que recebe grande prejuízo. E possui-os agora certo clérigo, de nome abade de S. Salvador de Macieira”.
Conclui-se destas citações que houve várias pessoas que se empenharam na construção da ponte: D. Sameiro, o rei D. Afonso Henriques (que dizem que até teve interesses amorosos nas redondezas...), ainda D. Sancho I, os Cavaleiros e certamente muita outra gente. Que a ponte terá ficado acabada no reinado do amante da odiosa Ribeirinha. Que a contribuição de D. Sameiro deve ter sido significativa, para a ela ficar ligado o seu nome. Que a colaboração régia terá sido com certeza maior que a disponibilização temporária do rendimentos dos dois casais mencionados em favor da obra. Sobre esses casais, havia ainda ao tempo das Inquirições uma questão pendente, que prejudicava o Rei.
A ponte de D. Sameiro, que é contemporânea de outras então construídas, não terá tido o êxito que se lhe antevia. A conquista do Alentejo e Algarve iam ocorrer nas décadas seguintes e com elas acabaria o corso mouro, o que valorizava as vias mais da beira-mar, com passagem por Azurara, Vila do Conde, Póvoa, etc.

Capela de Nossa Senhora das Neves


A mais antiga menção duma ermida, que poderia ser a antepassada da Senhora das Neves, vem só de 1608; chamava-se então a Ermida do Vale das Flores. Muito poético este nome, que pode remontar aos tempos da Cividade de Bagunte. O tombo de Bagunte, de 1559, não fala da ermida, mas apenas do Vale das Flores.
Em 1758, o pároco de Bagunte afirmou sobre a Senhora das Neves que ficava em “deserto, onde só existe um caseiro da Quinta de Cavaleiros”; que a administração da ermida pertencia a essa casa e que “o seu actual administrador é Gregório Ferreira d’Eça, fidalgo da Casa de Sua Majestade; e no dia quinto de Agosto, em que se festeja a mesma Senhora, concorre um numeroso convento de gente das freguesias circunvizinhas, que me dizem são umas vinte, e cada uma faz a sua procissão de preces, e querem sejam votos antigos a que indispensavelmente há-de assistir uma pessoa de cada casa e, faltando, o juiz do subsino os condena”. D. Gregório Ferreira d’Eça foi pai da primeira Condessa de Cavaleiros, D. Maria José Ferreira de Eça e Bourbon.
Na citação das memórias paroquiais há que relevar duas afirmações: a de que a ermida ficava em deserto, mas onde existia um caseiro da Quinta de Cavaleiros, e de que “querem sejam votos antigos”. Isto é, existia lá um caseiro, naturalmente na sua casa, mas noutros tempos podem ter existido mais habitações, ao modo do que aconteceu com a vila de Gacim, no Outeiro Maior, de que, no séc. XVI, ainda existiam alguns pardieiros, e que depois deixou de ser lugar habitado. Não seria ali a Cornelhã medieval? O Cerquido fica perto…
Os “votos” eram antigos, isto é, a sua origem perdia-se na voragem dos tempos.
Em tempo em que o lugar não teria pinhal, a ermida seria bem visível para nascente e norte.
A talha do altar da capela remontará apenas a cerca de 1700.
Um jornal poveiro de 1934 traz esta lenda sobre a origem da devoção à Senhora das Neves e da respectiva ermida:
“Corre entre o povo a tradição de que a imagem da Senhora das Neves apareceu naquele lugar, sendo conduzida à igreja paroquial de Bagunte; mas desapareceu do altar para de novo ser encontrada no mesmo local.
Repetindo-se o acto três vezes e reconhecendo o povo crente ser vontade da Senhora ficar ali, erigiram-lhe uma ermida, dando à imagem a invocação de Nossa Senhora das Neves”.
A invocação da Senhora das Neves é conhecida em Roma desde tempos muito recuados.

O rio Ave

Um rio como o Ave era para a freguesia origem de dificuldades e fonte de riqueza. Por referência a ele, as Inquirições falam moinhos, de pontes, dum porto, do narseiro. Se nos lembrarmos que em Balasar se fala também de portos, vemos logo que se trataria apenas de qualquer pequeno barco que fizesse na travessia do rio para ajudar peões ou até cavaleiros. Pode-se sempre supor contudo que ao menos em certas ocasiões o Ave fosse navegável até à foz.

Bagunte e o Mosteiro da Junqueira


Apesar da dimensão da freguesia, o Mosteiro da Junqueira não teve em Bagunte doadores significativos, quando foi da sua fundação, ao contrário do que aconteceu no Outeiro Maior, em que a quase totalidade da freguesia lhe terá sido entregue.
Nas Inquirições de 1220, diz-se apenas que este mosteiro possuía um casal na freguesia. Mas houve depois doações de vários propietários.
Segundo um documento atribuído a Afonso Henriques, Bagunte integrar-se-ia no couto do Mosteiro da Junqueira, uma vez que este ia “... pela foz do Este e depois pelo rio Ave acima até ao rio da Povoação e daí até ao cimo do monte de Lobos, depois até ao porto da Fontainha e depois pelo rio Este até ao Ave”. Parece porém tratar-se duma falsificação.

Santagões


Durante mais de um século, o nome de Santagões apareceu ligado a um documento a que se atribuía o título de ser o escrito mais antigo da língua portuguesa. Trata-se dum Auto de Partilhas, de 1192, em que se herdava a abadessa de Vairão, Elvira Sanches, mais os seus irmãos. Em escrita actualizada, o documento reza assim:
«In Christi nomine. Amen. Hec est notitia (Em nome de Cristo. Ámen. Esta é a notícia) de partição e de divisão que fazemos entre nós das heranças e dos coutos e das honras e dos padroados das igrejas que foram do nosso pai e de nossa mãe, nesta maneira:
Fonte:
Que Rodrigo Sanches fique por sua partição na quinta do Couto de Vitorino e na quinta do padroado dessa igreja, em todas as heranças do couto e fora do couto;
que Vasco Sanches fique por sua partição na Honra de Oliveira e no padroado dessa igreja, em todas as heranças de Oliveira e no Casal de Carapeços que chamam Olival e noutro casal em Aguiar, que chamam quintã;
Mem Sanches fique por sua partição na honra de Carapeços e nas outras heranças e na Honra e herança de Arguife e na herança de Lavoradas e no padroado da igreja;
Elvira Sanches fique por sua partição nas heranças de Santagões e nas três quartas do padroado dessa igreja e na herança de Creixemil, nos das sextas como noutra herança.
Estas partições e divisões fazemos entre nós, que valham pelos secula seculorum. Amen (séculos dos séculos. Ámen).
Facta karta mensse Marcii era M.ª CC.ª XXX.ª (feita a escritura no mês de Março de 1192).» (Segue-se a lista das testemunhas).
Elvira Sanches era natural de Carapeços, Barcelos. A propriedade que aqui recebe seria uma herança para seu dote (era preciso um dote para se ir para freira, para garantir o sustento).
Este documento fez história, naturalmente. Mas veio-se a descobrir que afinal o original de 1192 era em latim e este documento apenas uma tradução de tempos posteriores.

O testamento da abadessa Elvira Sanches


[1]O Dr. Eugénio Andreia da Cunha e Freitas concluiu que «o mais antigo progenitor da família dos Cunhas que se pôde alcançar» fora um tal Soeiro Rouco que, em 1084, herdara os seus filhos Aldora e Mendo Soares na Vila de Gacim.
[2] Diplomática
[3] Há Cirquido ou Cerquido nos limites de Bagunte com Balasar.
[4] Deve-se dizer Sameiro ou Zameiro? A resposta é Sameiro. Não interessa que, nesses tempos recuados, se escrevesse Zameiro, porque também se escrevia Zividad, Gazim, Alza Perna, para dizer Cividade, Gacim, Alça-Perna.
Como demonstrou o Dr. Eugénio da Cunha e Freitas no número 63 do "Facho», do Comércio de Vila do Conde, o patronímico Sameiro era raro na Idade Média. Todavia, é conhecido o nome de um Pedro Sameiro que, em 1225, faz uma venda em Cuvilana ou Covilana, que pensamos que seja o lugar balasarense da Covilhã.
Provavelmente, D. Sameiro da Ponte d’Ave será o mesmo que deu o nome ao monte do Sameiro onde se ergue o famoso santuário mariano do mesmo nome.
[5] Será D. Goncinha a esposa de D. Sameiro ou o maravedi terá de ser dividido para a obra de duas pontes, sendo Goncinha a Lagoncinha da ponte de Lousado?
Este documento e o seguinte que mencionamos têm respectivamente os números 177 e 160 no primeiro volume de Sérgio Lira.

Imagens de cima para baixo:


Três perspectivas da Ponte d'Ave ou de D. Sameiro.
Portal da Igreja do Mosteiro de S. Simão da Junqueira.
Auto de Partilhas.

Anexos

As Inquirições de Bagunte e Santagões


O nosso trabalho dirige-se ao leitor comum, especialmente o de Bagunte. Por isso, colocamos aqui alguns documentos latinos e arriscamos a sua tradução. Talvez fosse mais correcto falar de esboço de tradução, dados os nossos muito limitados conhecimentos sobre as rendas ou foros de que eles principalmente falam e até da original escrita dos números e mesmo da to. Mas estamos em crer que aquele leitor que até o latim desconhece agradecerá.
De Sancta Maria de Bogonti (1220)

Foros e dádivas

Menendus Gunsalvi abbas, Pelagius Gunsalvi, Johanes Gunsalvi, Menendus Petri, Duram Johannis, Johannes Petri, Pelagius Johannis, Johannes Michaelis, Suerius Petri, Petrus Vermuiz, jurati dixerunt quod dant de fossadeira de ista collatione xij. cubitos et quarta de bracali, j. solidum.
De quintana de Figueiroo dabant domino Regi in quocunque anno j. morabitinum, j. fogaciam de foro; et nutrierunt ibi filium de Monio Fernandiz, et ex tunc nichil dederunt. Et quando Maiordomus venerit per ibi dabunt illi de vita omnes qualem habuerint.
Et quando venerit ad ipsam terram dominus Rex dant ei de ista ecclesia j. fogaciam tritici, et de Vilar ij. fogacias tritici, et de Cacavelos et de Bogonti vj. vj. denarios pro pane. Et omnes de
ista collatione dant singulas gallinas. Et de Sauto de Cacavelos j. capom, x. ova. Et Maiordomus de pane dat Domino terre ij. morabitinos de meitiga. Et de ista ecclesia solebant dare Regi in quocunque anno iiij. morabitinos ; et clericus dixit quot dominus Rex Alfonsus, qui modo regnat, fecit ei cartam  quod non det illos.
In Quintana de Villar debet esse servizaria, et illa debet esse Maiordomus, et est pausa Regis.


Reguengos

 Menendus Gunsalvi abbas, Pelagius Gunsalvi, Johanes Gunsalvi, Menendus Petri, Duram Johannis, Johannes Petri, Pelagius Johannis, Johannes Michaelis, Suerius Petri, Petrus Vermuiz, jurati dixerunt quod habet ibi Dominus Rex iiij. casalia, et est unum heremum, et dant inde terciam panis et lini, et medium de vino; tamen dicunt quod debent dare terciam vini de novis vineis : et dant de directuris singulos almudes tritici per taligam de ratis, singulas spatulas, singulos cordeiros albos, singulos capones cum x. x. ovis, ij. Ij. caseos cum manteiga, et Maiordomo de pane iij. iij. cubitos de bracale, singulos frangaos. Et habet ibi Rex alios campos regalengos, et laborant de illis de Cacavelos et de Bogunti, et dant inde terciam et in locis quartam, et similiter laborant de illis de Villa Verde, et omnes qui ibi laborant dant singulos capones cum x. x. ovis, et dat illos Maiordomus ad laborandum qui vult pro sua offrecione, et dant medietatem de totis lampreis que ibi exierint in ribulo de Ave. Habebantur ibi alii campi regalengi de quibus fecerunt ij. casalia, et dicunt quod Dominus Rex Alfonsus dedit illa ad Pontem de domno Zameiro, et postea domnus Sancius concessit ipsi Ponti ipsa casalia et fecit inde illi cartam. Et nichil est negatum.


Santa Maria de Bagunte (1220)

Foros e dádivas

Mendo Gonçalves abade, Paio Gonçalves, João Gonçalves, Mendo Peres, Duram Enes, João Peres, Paio Enes, João Miguéis, Soeiro Peres, Pedro Vermudes, jurados disseram que dão de fossadeira desta colação doze côvados e uma quarta de bragal, um soldo.
Da quinta de Figueiró davam a El-Rei em cada ano um morabitino, uma fogaça de foro; e criaram aí um filho de Mónio Fernandes, e desde então não deram nada. E quando o Mordomo vier por aí dar-lhe-ão de vida todos como a tiverem.
E quando El-Rei vier a essa terra dão-lhe desta igreja uma fogaça de trigo, e de Vilar duas fogaças de trigo, e de Carcavelos e de Bagunte doze dinheiros por pão. E todos desta colação dão cada um sua galinha. E do Souto de Carcavelos um capão, dez ovos. E o Mordomo do pão dá ao Senhor da terra dois morabitinos de manteiga. E desta igreja costumavam dar ao Rei em cada ano cinco morabitinos;  e o clérigo disse que El-Rei D. Afonso, que agora reina, lhe fez carta para os não dar.
Na Quinta de Vilar deve haver serviceira, e ela deve ser Mordomo, e é pousada do Rei.


Reguengos

 Mendo Gonçalves abade, Paio Gonçalves, João Gonçalves, Mendo Peres, Duram Enes, João Peres, Paio Enes, João Miguéis, Soeiro Peres, Pedro Vermudes, jurados disseram que El-Rei tem ai quatro casais, e um está ermo, e dão daí a terça do pão e do linho, e meio do vinho; dizem contudo que devem dar a terça do vinho das novas vinhas: e dão de direituras cada um um almude de trigo pela taleiga de Rates, cada um uma espátula, cada um um cordeiro branco, cada um um capão com vinte ovos, quatro queijos com manteiga, e ao Mordomo do pão seis côvados de bragal, cada um um frango. E tem aí o Rei outros campos reguengos, e trabalham nelas pessoas de Carcavelos e de Bagunte, e dão dele a terça e em lugares a quarta, e igualmente trabalham pessoas de Vila Verde, e todos que aí trabalham dão cada um um capão com 20 ovos, e dá-os o Mordomo para trabalhar quem quiser, por sua oferta, e dão metade de todas as lampreias que aí saírem no rio Ave. Havia aí outros campos reguengos de que fizeram dois casais, e dizem que El-Rei Afonso os deu à Ponte de D. Sameiro, e depois D. Sancho concedeu à mesma Ponte esses casais e fez-lhe disso carta. E nada é negado.