segunda-feira, 7 de setembro de 2015

A IGREJA PAROQUIAL

Uma Igreja muito antiga


Como muitas outras igrejas paroquiais, a de Bagunte, com alguns acrescentos, ocupa o mesmo lugar onde originalmente foi erguida há mais de mil anos, dois séculos antes de Portugal se tornar independente e quando a ameaça moura já estava bastante afastada para sul.

Temos pronto o primeiro dos dois volumes que tencionamos publicar sobre Bagunte. Esperamos que em Novembro haja livros disponíveis.

Devia então ser pequena, que a gente era pouca pois os séculos precedentes tinham sido de escassa autoridade e repetida devastação. Até o bispo de Braga vivia muito longe, em Lugo, na Galiza.
Colocaram a capela-mor a nascente, como na Sé de Braga, como nas igrejas de Santa Clara e Matriz de Vila do Conde, como nas dos antigos mosteiros da Junqueira e de Rio Mau, como nas pequenas e antigas igrejas da vizinhança (Santagões, Outeiro Maior, Parada, Ferreiró, etc.)
Séculos atrás de séculos, as pessoas da freguesia foram ali baptizadas, ali frequentaram a eucaristia dominical, ali se casaram e, antes de se construir o cemitério, ali foram sepultadas. E também ali tomaram conhecimento de momentos particularmente felizes ou dramáticos da vida nacional, quando reis e arcebispos mandavam ler comunicações sobre nascimentos ou casamentos de príncipes e princesas, sobre mortes de reis, sobre guerras que se iniciavam ou findavam, sobre momentos de agitação revolucionária…


Igreja Paroquial

No século XVI

Dos primeiros 600 anos da existência da Igreja de Bagunte nada se sabe. Podemos conjecturar que fosse em pedra nua, coberta a telha (ao contrário das casas particulares), pouco iluminada, que possuísse algumas rudes esculturas (mais tarde substituídas por solenes quadros pintados), que tivesse sofrido um aumento porventura no século XVI, que lhe tivessem colocado um retábulo maneirista, como teve Santagões. Mas nada está documentado.
No Tombo de 1559 mediram-na assim:

Começaram (a medir) no corpo da dita Igreja e achou-se no vão dela, de comprido, nove varas e duas terças (cerca de 10,5 metros) e, de largo, seis varas e meia (cerca de 7 metros), de cinco palmos a vara; e na capela tem cinco varas e uma terça de comprido (mais de 5,5 metros) e de largo seis varas (mais de 6,5 metros).
Tem um alpendre ao redor da igreja da banda do sul até à capela principal; o adro, pela banda do sul, tem vinte e seis varas (cerca de 28,5 metros) para a porta principal da igreja e outras vinte e seis varas para a banda do norte e tem oito varas de largo (cerca de 8,5 metros) e da banda do sul tem de largo oito varas.

Embora muito sumária, esta é a mais antiga descrição que se conhece da Igreja Paroquial de Bagunte. Por comparação com o corpo do templo, a capela-mor era ampla. Em termos de largura, era mais estreita apenas cerca de meio metro e tinha mais de metade do comprimento dele[1].
O alpendre deveria servir para os viajantes da estrada que atravessava a freguesia. Voltado a sul, todavia, não protegeria muito contra a chuva e o vento, nem mesmo contra o sol.
Na memória de 1758, o abade Luís Freire do Couto falou da igreja nestes termos:

O orago desta Igreja é Santa Maria de Bagunte[2], cuja festividade se celebra no dia da sua Expectação, e consta de uma só nave, com cinco altares, o da sua Padroeira (o altar-mor), dois colaterais: o da parte do evangelho do Santíssimo Nome de Jesus, o da parte da epístola da Senhora do Rosário e desta parte o do Senhor na sua Agonia e daquela o das Almas.

À parte a informação de que a igreja possuía uma só nave, tudo o mais que diz se refere aos altares e seus titulares.
Há algumas diferenças face à actualidade: do lado norte, o do evangelho, estava, como hoje, o altar das Almas e onde se venera agora a imagem do Imaculado Coração de Maria haveria certamente uma composição evocativa do Santíssimo Nome de Jesus; frente a estes estavam respectivamente os altares do Senhor da Agonia e o de Nossa Senhora do Rosário. Não havia o da Senhora das Dores.
O Pe. Domingos da Soledade Silos, em 1845, limitou-se a informar que “a igreja desta freguesia é boa e está bem reparada, segura e decente; tem sacrário com Santíssimo Sacramento e também bons paramentos e todos os necessários”.


Antes do acrescento de 1950, a Igreja Paroquial era de reduzida dimensão.



[1] A vara de cinco palmos media um metro e dez centímetros.
[2] Num documento muito antigo, o orago não aparece assim designado, mas como São Salvador de Bagunte e Santa Maria.

Notícia de algumas obras


O século XVIII mudou muito a Igreja Paroquial. Basta que, em 1709, ela só tinha dois altares laterais e, em 1755, já tinha quatro.
Em 25 de Janeiro de 1749, o visitador Veríssimo Ferreira Marques capitulou algumas obras na igreja, uma no exterior, outras no interior. Para o interior determinou assim:

Os oficiais do Santíssimo (os mesários da respectiva confraria) mandarão fazer um dossel de madeira, a modo de pavilhão, que corresponda à largura do retábulo, com costa e coberta que tome toda a largura do mesmo retábulo e o altar até à parte do supedâneo para servir de guarda-pó e juntamente as cortinas (quando se fizeram) cobrirem todo o corpo do mesmo retábulo e o altar; seja de altura até ao friso do corpo da Igreja e a parede leve umas costas de madeira até cima, que corresponda ao altar (…)
A mesma obra do pavilhão ou dossel se fará em correspondência no altar da Senhora do Rosário (…)

De que altar estaria o visitador a falar? A Confraria do Santíssimo existia desde 1725, mas o sacrário não se encontrava no altar-mor, antes contra a parede da parte norte.
Da talha aqui capitulada já nada deve existir.
Em 1749, era pároco o encomendado Agostinho Ferreira Lopes.
Em 9 de Maio de 1755, já em tempo do abade Luís Freire do Couto, o mesmo visitador Veríssimo Ferreira Marques voltou ao caso do sacrário:

Achei o sacrário do Santíssimo Sacramento fora do seu lugar competente, que é a capela-mor, como parte principal do templo, e ao Rei dos Reis e Senhor dos Senhores se deve dar o melhor lugar. Pelo que, querendo os fregueses e oficiais do mesmo Senhor conservar o dito sacrário no altar, como se acha, há-de estar com a decência devida a tão grande Senhor; e para que o esteja são nele precisas as obras seguintes:
Um sacrário fixo, firme no altar, com todo o primor de arte, ao moderno, de madeira, que se lavrará, e estofado. Este se forrará por dentro todo de seda branca. O vaso em que se conserva o Santíssimo se dourará ao menos por dentro e lhe farão umas petrinas de seda branca da melhor que puder ser.
Farão um pavilhão de seda branca que tome a circunferência do sacrário, com suas franjas de ouro.
A porta imediata ao dito altar, que dá entrada à sacristia dos despejos[1], se tape de pedra e cal, ficando as padieiras descobertas pois não é justo e decente aquela passagem tão contígua ao altar, que é causa de mil irreverências que se fazem ao Senhor servindo-se dela, entrando e saindo com os trastes e despejos que que estão na dita sacristia (e a poderão abrir donde lhe for mais conveniente, mas da parte de fora).
E para que ninguém se chegue ao dito altar e encoste nele nas ocasiões de festas e mais funções públicas da igreja, se porão umas grades de pau, bem-feitas e torneadas, postas em boa proporção, que defendam o dito altar, assentadas sobre ladrilho, de pedra, a modo que faça degrau e tome o pavimento que se fizer a circunferência das grades.
O que tudo se fará no termo de três meses, pena de quatro mil réis, que aplico para as mesmas obras; e não o cumprindo assim no dito termo, o Rev. Pároco, com o teor deste capítulo, dará conta na Casa do Despacho para dela se executar.
Porém, querendo os tais oficiais e fregueses evitar estas despesas e obras que determino, e convindo o Rev. Pároco nisso, o poderão colocar no altar-mor, que está decentemente (?), sem ficarem com mais encargos e obrigações que aquelas que agora têm.

Entende-se que o que se capitula é de grande importância por se referir ao Santíssimo. Também se entende que tem a ver com as obras feitas aquando da criação da Confraria do mesmo Santíssimo e com as reservas que o abade impôs na altura, agora levantadas pelo novo abade. O sacrário foi mudado para o altar-mor.
As exigências quanto à riqueza do sacrário não eram muito razoáveis: o Rei dos Reis e Senhor dos Senhores teve por primeiro berço uma manjedoura e declarou bem-aventurados os pobres. Não eram o ouro, a seda e a talha que o glorificavam, antes as boas obras dos homens.
Pensamos que terá sido este o rico sacrário capitulado em 1755, que se compõe de sacrário propriamente dito e de uma espécie de baldaquino. Nas suas pequenas colunas deste vê-se o motivo bíblico da videira com as suas uvas.

Dois anos mais tarde, o visitador voltou. O rasgado elogio que deixou ao abade faz supor que estavam prontas as obras que tinha mandado ou sugerido.
Em 1 de Julho de 1760, Veríssimo Ferreira Marques deixou mais estes capítulos:

Vi ocularmente que se andava nesta Igreja assentando a entalha do arco cruzeiro, sanefas das portas e púlpito, obra que gostei de ver e de grande lustre para a mesma (…)
E por me parecer que em obra tão excelente fica com sua deformidade por estar o altar da Senhora do Rosário mais baixo e que igualando-se com o da outra parte ficará perfeita, os oficiais da mesma Confraria façam logo levantar o retábulo metendo-lhe uma banqueta ou banco com seu bocado de talha enquanto o mesmo mestre se acha fazendo a obra supra (…) e o remate do mesmo retábulo se porá por forma que imite o outro e o não exceda.

O caso do sacrário parece coisa do passado.
O retábulo da Senhora do Rosário existia, só ia sofrer ligeira modificação.
Três anos depois, em 4 de Julho de 1763, foi a vez do novo arcediago de Vermoim, Bernardo António da Silva Vieira, decidir mais obras também de talha. Mas encantou-se com o que estava feito:

Vendo que esta Igreja está perfeita e asseada e para o ficar inteiramente se precisa do douramento do arco cruzeiro, púlpito e sanefas, que há mais de quatro anos está feito de madeira, pelo que o Juiz da Freguesia, por conta dela, mandará dourar a dita talha na forma dos mais altares (…)
E porque precisa de ser igualmente dourado o acréscimo do altar da Senhora, os oficiais dela no mesmo tempo o mandem dourar (…)

Quatro anos adiante, em 10 de Junho de 1767, o visitador voltou a Bagunte. Tinha havido obras urgentes de conservação na igreja, mas estavam por concluir:

Por conta de ameaçar ruína a Igreja, resolveram os fregueses reparar o dano que resultaria de não a reedificarem, para o que concordaram com esmolas que bastassem para evitar o dano que da mesma ruína nasceria; porque estas não bastaram, além de não pagarem outros o que tinham prometido e se achar a obra principiada, mando ao Juiz do Subsino, por conta da freguesia, faça concluir a dita obra no termo de três meses (…)

A torre sineira vem de finais do século XVIII, tempo do abade Luís Freire do Couto.

A vontade do visitador seria talvez a reedificação do templo, mas adoptou-se uma solução mais barata. Os recursos eram limitados.
É de 1799 a notícia sobre a torre nova na Igreja Paroquial. Depois dela, só possuímos informação de novas obras pelas actas da Junta de Paróquia de quase um século mais tarde e de que a seu tempo daremos conta.
O retábulo do altar-mor deve ter sido substituído porventura ao tempo do abade Caetano Merouço Pego. O que nos leva a supor isso é por um lado não constar nela a talha barroca capitulada em 1749 e por outro algumas semelhanças que o retábulo actual tem com o da igreja de Touguinhó, que data de 1842 ou anos imediatos. Acrescente-se que não possuímos notícia de qualquer alteração na talha de período posterior à morte do abade mencionado.

A igreja ampliada

A Igreja Paroquial de Bagunte não é muito grande embora tenha sofrido um acrescento em 1950; mas desde há muito a freguesia possuía várias capelas que compensariam as limitações da matriz. Além disso, a freguesia não era particularmente populosa.
Da ampliação de 1950, não temos mais conhecimento que o que lá se vê. Era ainda tempo do abade Alfredo dos Santos Silva.
A Igreja Paroquial de Bagunte foi acrescentada para poente em 1950 como se regista sobre a porta principal.

[1] Arrumos?

NO INTERIOR MARIANO DA IGREJA DE BAGUNTE

Uma igreja mariana


Uma igreja mariana é uma igreja dedicada a Maria, a Mãe de Deus, Nossa Senhora.
No opúsculo O Culto Mariano no Arciprestado de Vila do Conde e Póvoa de Varzim, a igreja de Bagunte é a primeira[1] a ser descrita pelo autor, o Mons. Manuel Amorim, entre as “paróquias que têm Nossa Senhora como titular”. É uma descrição sucinta, mas ainda assim importante por se tratar de autor muito bem informado. Escreveu ele:

A igreja é de uma só nave e sofreu, recentemente, um acréscimo para poente. Tem cinco altares e dois grandes oratórios abertos em pequenas capelas no corpo da igreja. Quatro dos altares são dedicados a Nossa Senhora: o altar-mor da Padroeira, altar de Nossa Senhora do Rosário, altar de Nossa Senhora das Dores e altar do Sagrado Coração de Maria. No altar das Almas está uma bela composição escultórica de Nossa Senhora da Boa Morte. No altar de Nossa Senhora das Dores temos uma escultura das Santas Mães.
O tecto do corpo da igreja está pintado a óleo com medalhões historiando os mistérios de Maria: Natividade (nascimento do Salvador), Anunciação, Visitação e Assunção.

Interior da Igreja Paroquial de Bagunte.

Nossa Senhora da Expectação ou do Ó, a padroeira

O título de Nossa Senhora da Expectação ou Nossa Senhora do Ó, a padroeira da freguesia, aponta para um momento litúrgico próximo do Natal, 18 de Dezembro, que considera Nossa Senhora prestes a ser mãe e que se extasia perante o mistério do Filho de Deus que se faz homem em seu seio.
Esta invocação relaciona-se com um conjunto de sete breves cânticos, as antífonas do Ó, que então se rezavam e que começavam todas pela interjeição Ó: O Sapientia (Ó Sabedoria), O Adonai (Ó Deus), O Radix Jesse (Ó Raiz de Jessé), O Clavis David (Ó Chave de David), O Oriens (Ó Sol Nascente), O Rex Gentium (Ó Rei das Nações), O Emmanuel (Ó Deus-Connosco)
No início do século XVIII, um sacerdote descreveu assim a imagem da padroeira;

A imagem de Nossa Senhora da Expectação, com o seu Menino nos braços e com suas coroas de prata modernas.

Tratava-se duma imagem já antiga, mas não era propriamente uma imagem de Nossa Senhora da Expectação… pois já não estava à espera do seu Filho, que tinha nos braços.
Imagem recente de Nossa Senhora do Ó na Igreja Paroquial. O ventre volumoso ajusta-se ao momento que pretende evocar.

Retábulo-mor


O retábulo-mor não é aquele de que falava o capítulo de 1749 nem o mesmo com acrescentos rocaille de 1757 e que seria globalmente de barroco nacional ou joanino. Por qualquer razão que desconhecemos, cerca de um século depois, foi substituído pelo actual, de inspiração neoclássica, de boa execução. 
 Retábulo-mor da Igreja Paroquial.

Os medalhões do tecto

É natural que a igreja mariana de Bagunte exalte a Mãe de Deus: é esse o sentido dos medalhões do tecto, que representam a Anunciação do Anjo, a Visita a Santa Isabel, a Natividade e a Assunção. Estes medalhões devem reproduzir belos quadros clássicos, donde está ausente um mínimo de enquadramento realista dos momentos fixados.



Medalhões marianos do tecto a igreja: Anunciação, Visitação, Natividade do Salvador, Assunção ao Céu.


[1] É a primeira em razão da ordem alfabética.

Os retábulos laterais

  
Retirados os altares laterais, os retábulos respectivos ficaram reduzidos a ricas molduras das imagens. Esses altares eram, com uma pequena diferença, os que o abade Luís Freire do Couto assinalou na memória paroquial. Consideremos agora o de Nossa Senhora do Rosário. 
Retábulo de Nossa Senhora do Rosário.

Flávio Gonçalves declara rocaille a talha da nave da igreja de Bagunte[1], mas este retábulo é no mínimo compósito, como o mesmo autor parece reconhecer quando afirma que há na igreja partes de retábulos de estilo nacional: aquelas colunas espiraladas por onde trepam videiras e onde pousam aves são ainda atributos inconfundíveis da decoração da talha nacional, isto é, de muitos anos antes de se divulgar o gosto rocaille. Foi em tempo do abade Luís Freire do Couto que se fez a alteração. A imagem de Nossa Senhora do Rosário embora pareça antiga tem um tamanho desproporcionado para o seu enquadramento.

O retábulo que emoldura a imagem do Imaculado Coração de Maria é muito semelhante ao da Senhora do Rosário, mas a delicada imagem deve vir apenas do século XIX na sequência das revelações de Lurdes. 
Retábulo do Imaculado Coração de Maria.

Algumas palavras sobre as videiras e as aves das colunas.
Esculpido em pedra no século XVI, o elemento decorativo da videira com as suas uvas já ocorre na Matriz vila-condense. Evoca com certeza a bíblica Vinha de Israel e o vinho da Eucaristia. A ave deve ser a Fénix da mitologia, que, segundo a lenda, regressava à vida ciclicamente 500 anos depois de morrer; aqui deve anunciar a ressurreição.

Retábulo das Almas

O retábulo das Almas parece-nos mais condizente com o rocaille, embora acima das duas imagens laterais se vejam ainda restos de colunas salomónicas.
O painel contém os elementos usuais: ao cimo a Santíssima Trindade, ao meio Nossa Senhora em atitude de intercessão e o Anjo com a balança, pronto a avaliar o mérito dos sofredores do Purgatório, e ao fundo as Almas. O artista identificou apenas uma, o rei com a sua coroa. Este artista revela-se um escultor muito pouco hábil. E deve ser o mesmo que esculpiu as cabeças dos anjos que são frequentes na igreja. 
Retábulo das Almas.

Segundo a bandeira, a Confraria das Almas foi instituída em 1715.
  
A Dormição de Maria ou a Senhora da Boa Morte

Como Jesus, a sua Mãe também morreu, mas foi depois elevada ao Céu em corpo e alma. A tradição teológica fala também de Dormição em vez de morte.

A Dormição de Maria sob o retábulo das Almas.

O Mons. Manuel Amorim escreveu assim sobre a composição da Dormição na Igreja Paroquial de Bagunte que se encontra sob o painel das Almas:

A morte da Virgem Maria ou Dormição mereceu, entre os orientais, uma predilecção especial com culto anterior à própria Assunção se bem que os dois acontecimentos andem, por vezes, associados.
A iconografia da Dormição apresenta o corpo da Virgem Maria deitado ou jacente quer em simples catre quer no túmulo, como no Santuário da Correlhã, Ponte do Lima, quer em composições simbólicas como a temos na Igreja de Bagunte, jacente, sobre um barco que os anjos conduzem ao porto celestial.

Acrescente-se que este tipo de iconografia é raro.

[1] “(…) a talha do terceiro quartel do século XVIII obedece sempre, no concelho de Vila do Conde, ao gosto do rocaille: retábulos da nave da igreja paroquial de Bagunte (…)”

Oratório do Senhor da Agonia


É na memória paroquial que se encontra a primeira referência ao altar do “Senhor na sua Agonia”. Mas não é de crer que a cruz e as imagens fossem as de hoje: a imagem do crucificado quase em tamanho natural, mais São João Evangelista e Santa Maria Madalena. Devem antes ter sido aquisição posterior, em todo o caso, antes da talha que nele se encontra.
O que nos leva a supor isso é a própria talha: neste oratório não há colunas de estilo nacional ou joanino, tudo é novo, rocaille. A iconografia deste oratório implicou um investimento vultuoso.
Ao tempo do arrolamento republicano, como hoje, já se acumulavam ali os dois grupos escultóricos: o original, do Senhor da Agonia, e o grupo mais recente, do tempo do Pe. João Silva, que representa a aparição do Sagrado Coração de Jesus a Santa Margarida Maria Alacoque. Estas duas novas imagens, em tamanho natural, devem ser a mais antiga representação desta aparição em larga redondeza, uns 40 anos mais antiga que a da basílica poveira dedicada a esta devoção. É uma pena que este grupo não tenha lugar próprio, condigno, que deixasse livre todo o oratório para a cena do Calvário.

Monumental oratório do Senhor da Agonia, que hoje acolhe também as imagens do Sagrado Coração de Jesus e de Santa Margarida Maria Alacoque.

Como o retábulo das Almas, que lhe fica em frente, este possui sanefa, sem dúvida a capitulada em 1760.

Pormenor do oratório do Senhor da Agonia onde se podem admirar a decoração rocaille e a coluna do mesmo estilo.

Oratório da Senhora das Dores

Este oratório deve ser recente: mesmo o arrolamento republicano ainda não o conhece.
A talha reduz-se à moldura que está por trás da imagem, mais a espécie de estrado, muito singelo, em que esta assenta. Foi tudo concebido para condizer com o rocaille[1] predominantemente na Igreja.

Nicho de Nossa Senhora das Dores, ladeada por duas imagens que aparentam ser muito antigas.

Com a chegada da amplificação sonora, os púlpitos deixaram de se justificar. Antes, eram imprescindíveis para o pregador se fazer ouvir de toda a assembleia dos fiéis[2].
Na Igreja de Bagunte, o púlpito continua como uma bela peça de mobiliário a recordar um longuíssimo passado. É com certeza o mencionado em 1760.

Púlpito da Igreja de Bagunte.

Para o encosto deste banco que se encontra ao lado do altar aproveitou-se parte da sanefa do arco cruzeiro (que tinha sido alargado).

[1] A devoção à Senhora das Dores, como ao Senhor da Agonia, é um mergulho fundo no cerne da mensagem cristã, centrada na Cruz de Cristo. Durante a primeira metade do século XX, na Póvoa de Varzim, o Pe. José Cascão deu grande contributo para popularizar a devoção à Senhora das Dores. O oratório da Igreja de Bagunte deve ter alguma relação com a pregação deste culto sacerdote.
[2] Em tempos recuados, nas universidades também se ensinava de um púlpito.

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